Vaidade


A igreja do rei


Tradição Cristã

Era uma vez um rei que quis edificar uma igreja magnífica em honra da Virgem, decretando que ninguém nos seus estados pudesse contribuir para a obra, ainda mesmo que com a mais pequena quantia. Quando o edifício se concluiu, enorme, soberbo, grandioso, mandou o rei gravar numa pedra de mármore uma inscrição em letras de oiro, que dizia que só ele, e mais ninguém, tinha levado a cabo aquela obra monumental. Mas, na noite seguinte, o nome do rei foi apagado da inscrição, substituído pelo de uma pobre mulherzinha do povo. O rei, ao outro dia, tornou a mandar gravar o seu nome na inscrição, e de novo foi substituído pelo da pobre mulher; à terceira vez, sucedeu o mesmo. O rei, cheio de cólera, ordenou então que lhe levassem a mulher à sua presença.

Proibi a todos os meus vassalos — disse ele — que contribuíssem fosse com o que fosse para a edificação desta igreja; vejo que não cumpriste as minhas ordens.

Senhor — respondeu a velhinha toda trémula – eu respeitei as vossas ordens, apesar da mágoa que sentia por não poder oferecer o meu pequenino óbolo em honra da Virgem, mas julguei não desobedecer a Vossa Majestade, deixando por vezes de jantar para comprar um pouco de feno, que eu levava às escondidas aos bois que conduziam as pedras destinadas à construção da igreja.

— O teu nome é mais digno do que o meu de figurar em letras de oiro na inscrição do monumento — disse-lhe o rei.

Mas, na noite seguinte, uma invisível mão restabeleceu na lápide da igreja o nome do rei, que desde então lá se conserva ainda.

Guerra Junqueiro
Contos para a Infância
Porto, Editora Justiça e Paz, 1987

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