Honestidade


Ana e a galinha pedrês

Esta história passou-se na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial. A comida era escassa. As pessoas, sobretudo as crianças, alimentavam-se mal e estavam sempre esfomeadas.

Todas as semanas, Ana ia ao campo à procura de alimentos. Levava a bicicleta, mas andava demasiado cansada para pedalar. Caminhava devagar, empurrando-a. Mas até isso fazia com que o seu coração batesse depressa. Ultimamente, sentia-se sempre cansada.

E também desanimada. Nem aos agricultores restava qualquer legume. À excepção de algumas beterrabas que um homem lhe tinha dado, mais ninguém lhe dera ou vendera o que quer que fosse.

Naquele instante, Ana apercebeu-se de que não podia continuar. Tinha de parar e de descansar. Tombou a bicicleta, assegurando-se primeiro de que as beterrabas não caíam do cesto. Depois estendeu-se na relva fresca.

Sonhou com comida. Parecia que, nos últimos tempos, todos os seus sonhos tinham a ver com comida. Desta vez, sonhou com cenouras douradas, cozidas a vapor, com natas e manteiga. Mesmo no sonho, Ana sabia que isso era uma loucura, porque não conseguia recordar-se de alguma vez ter comido manteiga ou natas. Mas a mãe tinha-lhe falado sobre isso e, no seu sonho, quase podia provar aquela delícia.

Sonhou, em seguida, com tomates, vermelhos e sumarentos. Havia um monte deles e Ana preparava-se para comer um, quando tudo desapareceu. Acordou de repente e sentou-se. Na sua frente estava uma galinha pedrês. Olharam uma para a outra.

De repente, Ana apercebeu-se de que a galinha estava a falar. Pelo menos, estava a cacarejar e a falar da maneira que as galinhas falam.

Porque é que estás a olhar para mim, sua tonta? perguntou Ana. Fazes tanto barulho que me acordaste.

Cu-u-u-t… cu-u-u-t… disse a galinha, e recuou, assustada com a voz zangada de Ana.

Foi então que Ana viu o ovo! Pegou nele cuidadosamente. Ainda estava quente.

Oh, minha linda, linda galinha! exclamou. Desculpa ter sido dura contigo. Obrigada por este ovo maravilhoso!

A galinha pedrês afastou-se e Ana ficou sozinha com o ovo. Agora que descansara, sentia-se melhor.

Tinha de ir depressa para casa, dar o ovo à mãe. Talvez pudessem comer uma omeleta pequenina!

Ana tirou o lenço que usava na cabeça. Com cuidado, embrulhou o ovo e pô-lo delicadamente no cesto, juntamente com as beterrabas. Montou na bicicleta e começou a subir a estrada. Mas um pensamento triste tomou conta dela. Na verdade, o ovo não lhe pertencia. Pertencia ao dono da galinha pedrês. Ana começou a pedalar cada vez mais devagar.

“Não”, disse energicamente para si mesma, “o ovo é meu. A galinha pô-lo mesmo ao meu lado enquanto eu dormia.” Continuou a subir a estrada. “De qualquer forma, não sei de quem é a galinha. E mesmo que soubesse, ninguém ia adivinhar que eu tenho o ovo.”

Havia uma casinha branca perto da estrada. “Não conseguem ver nada”, disse Ana para consigo. “Tenho o ovo todo coberto.” Começou a pedalar mais depressa.

Mas parecia que a bicicleta ia cada vez mais devagar. E, quando chegou perto da casa branca, as pernas já não conseguiam pedalar. Muito lentamente, desceu da bicicleta e dirigiu-se à casa.

Sim? perguntou a jovem mulher que veio à porta.

Com muita relutância e o sonho da pequena omeleta a desvanecer-se rapidamente, Ana indagou:

Tem… tem… uma… uma galinha pedrês?

Sim, temos respondeu a mulher.

Lenta e cuidadosamente, Ana tirou o ovo do lenço e entregou-o à mulher.

Então, isto também lhe pertence disse numa voz quase inaudível.

Oh, muito obrigada. Aquela galinha anda sempre a vaguear e a deixar os ovos nos sítios mais improváveis. É a única que nos resta, e precisamos dos ovos dela para o nosso pequeno. É que ele está muito doente.

Ana preparava-se para ir embora. A jovem mulher parecia perturbada.

Foste tão amorosa disse. Gostaria de te dar algo para pores no cesto. Mas não temos quase nada. Eu… eu não tenho nada para te dar.

Não faz mal disse Ana. E montou outra vez na bicicleta. Ansiava por sair de perto daquela casa, da galinha pedrês e do ovo maravilhoso.

Quando chegou a casa, Ana contou à mãe o que se tinha passado. Teve medo de que a mãe lhe ralhasse por chegar tarde e por só trazer algumas beterrabas. Quem sabe se até se zangaria por Ana não ter ficado com o ovo…

Mas a mãe apenas acariciou o cabelo de Ana e olhou-a durante muito tempo, sorrindo.

Então não ficou zangada comigo, mãe? Não lhe parece que sou nova demais para ir ao campo tentar arranjar legumes?

Não, Ana. disse a mãe. Estou aqui a pensar na filha maravilhosa que tenho. Quando se anda sempre com tanta fome, só um verdadeiro adulto poderia ter tomado uma decisão tão difícil.

Ruth Hunt Gefvert

M. Clark; E. Briggs; C. Passmore
Lighting candles in the dark
Philadelphia, FGC,2001

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