Respeito por si próprio


A história da menina a quem chamavam “a senhorinha”


Era uma vez uma menina que tinha crescido demasiado depressa, demasiado rapidamente. Não apenas no corpo, nas pernas, nos braços, mas em tudo o resto. Com oito anos, pedia-se-lhe que fosse prestável, atenta, razoável.

Que não se queixasse, que não se encolerizasse, que não fosse caprichosa, que não fizesse exigências.

Que fosse “uma senhorinha”, pois!

Não pensem que os seus pais eram uns carrascos. Oh não! Eles apenas lhe pediam:

— Dá-nos este prazer. Não te pedimos nada a não ser que sejas gentil, que sejas obediente… não é difícil!

Como esta menina nunca tinha ousado pedir fosse o que fosse, nunca se tinha sentido desapontada. Não sabia se era feliz ou não. Não tinha desejos próprios. Não esperava nada. Eram os outros que esperavam coisas dela. E o seu único prazer… era dar prazer… aos outros!

Pelo menos, assim o imaginava ela. No entanto, qualquer coisa deveria tê-la alertado, porque os outros não demonstravam lá muito a satisfação que tinham por ela ser “como deveria ser”. Para eles, era óbvio. Para ser franco, devo dizer que, por vezes, à noite, antes de adormecer, quando ela chupava o polegar, com o lençol debaixo do nariz, os olhos abertos no escuro, um sentimento de injustiça roçava nela como uma asa negra. Oh… mas apenas roçava!

Ela também imaginava que havia um país onde as meninas podiam ser pequenas durante muito, muito tempo. Um país onde os pais escutavam os desejos das crianças, mesmo se nem sempre os realizavam. Um país onde as crianças podiam brincar a ser grandes, mas apenas brincar… a ser grandes! Em algumas noites, ela imaginava que partia para esse país, com um grande saco, e que o enchia de sonhos, de jogos, de risos e também de soluços.

É que, vocês já adivinharam, esta menina não chorava nunca… porque devia portar-se como uma “senhorinha”.

A continuação da história é surpreendente. Será necessário que esta menina espere pelos seus quarenta anos. Ouviram bem, quarenta anos, para ousar tornar-se pequena, para ousar ter desejos impossíveis, para ousar chorar e rir, para ousar dançar.

Nessa altura, ela já tinha filhos e, um dia, a sua própria filha perguntou:

— É verdade, mamã, que tu nunca pudeste ser pequena quando eras criança?

— É verdade, eu vivi como se nunca tivesse tido nem tempo, nem possibilidade de ser pequena. Sim, muito cedo me tornei grande. E só hoje compreendo. Tudo se passou como se os meus próprios pais não tivessem tido tempo para crescer quando eram crianças, e eu devesse ser grande por eles…Acontece, por vezes, às ex-meninas terem de esperar muito, muito tempo, para ousarem, enfim, ser pequenas…

Jacques Salomé
Contes à guérir. Contes à grandir.
Paris, Albin Michel, 1993


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